Escrevi, em 23 de junho, neste blog, quando estava voltando do Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental, realizado na cidade de Goiás Velho:
"O vencedor do festival chama-se "Corumbiara", de Vicent Carelli. É uma obra-prima. Já vi muitos filmes sobre índios, em sua grande maioria chatíssimos, paternalistas, sem ritmo, sem nada a dizer. Pois 'Corumbiara' tem ritmo e muita coisa a dizer sobre o massacre de uma tribo indígena em Rondônia na década de 80. É também um filme sobre cinema, sobre as capacidades e os limites das imagens em movimento. O documentarista não apenas narra a sua longa investigação, como também demonstra como foi reagindo aos fatos ao longo dos anos. Às vezes parece 'Cabra marcado para morrer', de Eduardo Coutinho (pelas idas e vindas do tempo), mas na verdade é mais complexo e mais emocionante. Não sei que tipo de circuito vai ter esse filme, mas, seja onde for, prezado leitor, trate de assisti-lo."
No último sábado, "Corumbiara" recebeu o Kikito de Melhor Filme Brasileiro em Gramado, onde fora exibido na terça-feira para um público pequeno. Como se sabe, receber prêmio em Gramado – mesmo que seja o principal – há muito deixou de ser garantia de exibição em grande circuito, mas pelo menos provoca uma certa curiosidade para um filme cujo tema parece ser árido ("Pelo amor de Deus: outro filme sobre índios massacrados…") e cujo título não ajuda muito ("Corum… esqueci o resto"). Não sei quando o filme vai passar em Porto Alegre – ou na cidade de quem está lendo este blog -, então deixo aqui apenas a minha renovada advertência: os índios massacrados – os sobreviventes, é claro – são muito simpáticos e usam drogas muito divertidas; a montagem é genial; a impressão, quando o filme termina, é de que esse país não tem jeito. E, como disse Woody Allen, se o filme diverte e incomoda o espectador ao mesmo tempo, o diretor fez um bom trabalho. Parabéns, Vincent Carelli!
Em tempo: ao comentar a premiação de Gramado, meu amigo Roger Lerina, na Zero Hora de hoje, diz que a lista de longas brasileiros concorrentes é "uma das mais fracas seleções dos últimos anos". Tudo bem. Respeito a opinião do crítico e nem posso discuti-la, pois não assisti a todos os filmes. Mas, de certa forma, ao dizer que "Corumbiara" venceu porque não tinha bons concorrentes, Roger está desmerecendo o título do filme de Carelli. Então, só pra deixar bem clara minha posição: não vejo, no cinema brasileiro dos últimos cinco anos, filme – ficção ou documentário – capaz de concorrer com "Corumbiara", perante um júri competente e honesto, e tirar-lhe este Kikito. Não sei como foram as discussões no júri de Gramado, mas as de Goiás Velho eu posso revelar, pois eu era um dos jurados: concorrendo com mais de 40 filmes de altíssimo nível, vindos de todo o mundo, "Corumbiara" venceu por unanimidade (eram sete jurados, incluindo um francês e um chileno).