Quando foi inventado, em 1895, o cinema “naturalmente” seguiu as regras e as leis que a indústria da fotografia estabelecera nada “naturalmente”. Quem lembra os nomes das dezenas de operadores da indústria dos irmãos Lumière? Lembramos apenas dos seus patrões, os empresários Lumière, que detinham o poder econômico. Nos Estados Unidos, Thomas Edison criou, numa velocidade incrível, uma máquina muito bem azeitada de fazer filmes, cuja autoria hoje atribuímos ao próprio Edison, esquecendo das dezenas de operadores de câmera, diretores de arte e montadores que também trabalharam nas películas.
“Fue sobre todo em el cine donde la socialización de la indústria produjo la socialización del sujeto-criador y más adelante lá aparición del sujeto colectivo. Sin embargo, fue mediante la aquisición de material de origen literário, productos informativos, etcétera, y sirviéndose com prudência de ese privilegiado instrumento del capitalismo que es el contrato, que tanto la “materia prima intelectual” como la “fuerza de trabajo intelectual” del cine fueron monopolizados bajo el control del productor. Desde un principio, los tribunales reconocieron al productor como autor y por tanto propietario de la ‘creación’ producida.” (TAGG, p.148)
Os operadores das câmeras dos irmãos Lumière e de Thomas Edison, portanto, eram obrigados a abrir mão de um possível status de “recriadores da realidade” (base da legislação que tornou possível a propriedade de fotos e, logo depois, dos filmes cinematográficos), para aceitar um contrato de trabalho tradicional, em que eram vistos como mão-de-obra anônima. “En la combinación de la ‘esfera de la creación’ y el ámbito de la producción industrial, la representación legal designaba al ‘sujeto creativo’ como el capital mismo” (TAGG, p.149)
No Brasil contemporâneo, o capital, com toda certeza, não está concentrado nas mãos das empresas produtoras, e muito menos nas dos realizadores dos filmes. O capital está nas mãos dos distribuidores, em sua grande maioria empresas multinacionais, e, em menor escala, dos exibidores. Não é de se estranhar, portanto, que sejam os distribuidores os grandes responsáveis pela campanha de combate à pirataria. A MPA (Motion Pictures Association), que nos Estados Unidos é uma associação de produtores, aqui no Brasil se relaciona basicamente com os distribuidores, nesta e em outras ações voltadas ao mercado. Em seu site, que contém uma seção exclusiva e de grande destaque dedicada à pirataria, há uma frase interessante: “ALL forms of piracy are illegal and carry serious legal consequences.” (Site Oficial da MPA, 2007). A grafia de “ALL”, em caixa alta, serve para estabelecer, com toda a ênfase possível, o que, para a MPA, é a verdade definitiva: a distribuição de produtos audiovisuais em meios não submetidos ao seu controle (ou seja, não regulamentados) é um crime.
Contra essa “verdade” absoluta, que aparentemente tem a seu favor leis nacionais (no Brasil, o Título III do Código Penal, “Dos Crimes Contra a Propriedade Imaterial”, em especial o artigo 184, que trata da violação dos direitos de autor e os que lhe são conexos) e internacionais, começam a surgir algumas contestações. Manoel Almeida, da Revista Consultor Jurídico, (ALMEIDA, 2007), lembra um detalhe muito importante: em todas aquelas advertências que costumamos ler antes de assistir a um filme em DVD, que ameaçam o espectador caso este faça uma cópia do produto em sua casa, está sempre omitida a expressão “intuito de lucro”, que a lei, explicitamente, nos parágrafos 1 a 4, considera como condição para que a cópia seja criminosa.
Para Manoel de Almeida, se a lei prevê a penalização apenas quando a cópia é realizada visando ao lucro, direto ou, indireto, então:
“Contrario sensu é permitida a cópia integral (grifo do autor) de obra intelectual, sem autorização do detentor do direito autoral, desde que não se vise lucro, seja direto, seja indireto, mas é proibida a cópia não autorizada, mesmo parcial, para fins lucrativos. Assim, não comete crime o indivíduo que compra discos e fitas “piratas”, ou faz cópia para uso próprio; ao passo que se o locador o fizer poderão configurar-se violação de direito autoral e concorrência desleal.”
Pelo Princípio da Reserva Legal, segundo o qual não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia fixação legal, a cópia integral não constitui sequer contravenção. No Brasil, quem baixa arquivos pela internet ou adquire produtos piratas em lojas ou de vendedores ambulantes não comete qualquer ato ilícito, pois tais usuários e consumidores não têm intuito de lucro. (ALMEIDA, 2007)
Certamente esta é uma afirmação polêmica, e não faltarão advogados (e dos melhores, contratados pelas distribuidoras internacionais, pelo ECAD e pela MPA) para contestá-la. Mas o simples fato das distribuidoras omitirem um dado específico da lei brasileira já demonstra que um certo “regime de verdade” está sendo construído, a partir de um discurso cuidadosamente articulado. E mais: se a legislação brasileira for modificada, o que parece ser inevitável, com as constantes transformações tecnológicas e a convergência digital, já se prepara um cenário adequado para que estas mudanças atendam, mais uma vez, aos interesses das corporações. E o autor? Esse, como sempre, vai a reboque, pois pode ser precioso na hora de exibir a suposta vítima dos piratas.
TAGG, John. El peso de la representación. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 2005
ALMEIDA, Manoel. Tabu pirata: download de filmes e livros para uso privado não é crime. Revista Consultor Jurídico. Disponível em:
<conjur.estadao.com.br/static/text/58709,1>. Acesso em: 23 ago. 2007
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