Cinco maneiras de fechar os olhos

Foi com muita alegria e um grande orgulho (já que fui professor de toda a equipe) que assisti à sessão de "Cinco maneiras de fechar os olhos" no último sábado, no Cine Santander Cultural. O fato de ser o primeiro longa-metragem inteiramente realizado nas disciplinas regulares de um curso de cinema no Brasil é um detalhe menor, frente ao êxito do projeto como obra cinematográfica em si. Tanto estética, quanto tecnicamente, ele pode ser analisado sem qualquer tipo de ressalva ou paternalismo. É que faço rapidamente a partir daqui.

 

A história, fragmentada em cinco núcleos narrativos que se interpenetram – às vezes de forma explícita, às vezes com muita sutileza – está bem estruturada, o que não é tarefa fácil. O roteiro não parece ser uma criação coletiva (o que realmente é). As armadilhas eram muitas, mas a equipe soube manter a essência da trama. Sempre há um personagem em primeiro plano chegando a uma bifurcação e tomando uma decisão fundamental para sua vida. Me liberto do casamento, ou continuo dependendo dele? Me liberto dos sonhos da minha mãe, ou continuo preso a eles? Conto a verdade sobre minha sexualidade, ou continuo escondendo? Me mato, ou continuo vivendo?

 

"Cinco maneiras de fechar os olhos" é um retrato sensível e sincero sobre a dor de escolher um caminho. Mesmo que os realizadores sejam jovens, eles sabem que essa dor atinge velhos, adultos. adolescentes e crianças, e é notável que uma das melhores cenas do filme, a conversa entre a dona do restaurante (Áurea Baptista) e seu ex-marido (Júlio Conte), sobre o filho de ambos, pertença a um universo que está, teoricamente, longe deles.

Destaquei dois atores, mas o elenco é homogêneo e merece ser elogiado na íntegra. Não sei se os realizadores utilizaram algumas das lições que tentei passar em minhas aulas – ensaiar o máximo possível, por exemplo – mas, mesmo que tenham ignorado solenemente o que tentei ensinar, de alguma forma aprenderam. O que mais pode querer um professor?

 

Chamo atenção para alguns detalhes técnicos importantes: a direção de arte, que manteve o realismo mesmo com o baixíssimo orçamento, e a trilha sonora, que combina um som direto quase perfeito com uma seleção musical sempre dramática e adequada. A fotografia também funciona muito bem, e eventuais momentos sem foco acabaram sendo incorporados à estética do filme, num bom exemplo do defeito que vira efeito. Ao contrário de meus primeiros filmes em super-8, lá no começo da década de 80, não é preciso fechar os olhos para deficiências técnicas. Só esse fato já justificaria a existência dos nossos cursos de cinema.

Uma última palavra para os realizadores (todos eles, mas em especial aos que carregaram o piano da produção, realizando todas aquelas tarefas complicadas e anônimas que permitem o filme existir):  vocês criaram uma obra de arte, o que sempre é um milagre e depende de muitas variáveis, algumas  delas incontroláveis. "Cinco maneiras de fechar os olhos" agora fala por si e terá aquela carreira difícil e às vezes pouco animadora de 99% dos filmes brasileiros. Façam o filme circular, ouçam  as críticas e os elogios, e continuem aprimorando suas habilidades. Procurem a especialização individual, mas mantenham esse espírito de equipe, seja ela qual for. E o mais importante: quando vem o próximo?            
 

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